quinta-feira, 30 de agosto de 2012

O MAL

            O mal está aqui.  Posso ouvir a sua voz.  Posso sentir o seu veneno vibrando no ar.  Ele sabe que eu sei.  Ele fica a espreita.  Já tentou me destruir uma vez e não conseguiu.  Agora ele tem medo.  Sabe que eu sou forte. 
Cerca-me com cuidado, mas tem medo.  Precisa de mim para sobreviver no mundo material.  Sou eu que o mantenho vivo.  Sua cria é inepta.  Ele tem ódio por isso.  Ele é ela.  Sinto seu pensamento tentando invadir o meu.  Tenta me assustar, mas não consegue mais. 
Eu sou mais forte, eu tenho a força para mantê-lo subjugado. 
Ele caminha para a falência de seu substrato material e tem medo de voltar ao inferno.  Ele sabe que voltará, é apenas uma questão de tempo.  Quanto tempo?  Quem sabe? 
Quem tiver ouvidos, que ouça.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Profecia
            A cada desentendimento voltam as visões do passado.  O que se mostrava como sonhos, devaneios e inseguranças da imaturidade, vem agora como profecia a assustar meus medos.  Eis que vejo cada vez mais perto a hora marcada, destinada.  Um não mais se encontra entre nós, outro tem a partida próxima.  Então o novelo do destino rolará pelos abismos do tempo a desfiar-se.  Redes e tramas serão tecidas e o louco se verá cego e abandonado.  O caminho se dividirá, separando a abastança da indigência.  De um lado encontrar-se-ão casacos de vison e sapatos de pelica, do outro, calças rotas e pés feridos.  Os caminhos se afastarão ligeiros e jamais se reencontrarão.  O tempo passará veloz para uns, mas os anos terão a eternidade para outro.
            O louco deixará a caverna na grande montanha levando apenas os seus, também loucos, conhecimentos.  Devaneios em papéis velhos que só a ele interessam.  Vagará pelas terras de baixo, falará aos homens e deles receberá  pedras.  Irá chorar todas as noites, quando seu corpo encontrar o leito e lembrar da grande montanha.  Lá, sentia-se um pouco mais perto de Deus. 
            As noites e os dias passarão aos milhares até que os que ficaram na opulência interessem-se em saber do destino do louco.  À bordo dos seus luxos farão grande procura mas ele não se deixará encontrar.  A esquálida sombra nem de longe lembrará o homem robusto do passado.  Mesmo que irreconhecível, não se deixará mostrar e observará os senhores pomposos por entre folhas e ramos.
            Mais anos se passarão, quando deixará de ser um louco na multidão para se tornar um velho louco na multidão. 
            Um dia, deitado numa cama de tábuas mal pregadas, esperará o grande ceifador.  Mas a profecia diz que antes da hora final alguém com seu sangue virá e o nominará.  A morte será precedida e ele chorará pela última vez. De felicidade. 
            Quem tiver ouvidos, que ouça.